Lei n. 14.994/24: Avanços no Combate à Violência contra a Mulher

Sancionada em 10 de outubro de 2024, a Lei n. 14.994/24 representa um marco significativo na legislação brasileira, promovendo alterações em diversos diplomas legais e introduzindo mudanças cruciais no combate à violência contra a mulher. Entre as principais inovações, destaca-se a criação do artigo 121-A no Código Penal, que eleva a pena para o crime de feminicídio, agora punido de forma autônoma, com pena de reclusão de 20 a 40 anos.

Feminicídio como crime autônomo e elevação da pena

O feminicídio, antes tipificado como uma qualificadora prevista no inciso VI do artigo 121 do Código Penal, agora é tratado como delito autônomo, no novo artigo 121-A do diploma penal.

Vale dizer que a pena também foi aumentada, pois, antes da inovação legislativa, o feminicídio possuía pena de reclusão de 12 a 30 anos, agora o ato de matar uma mulher, por razões da condição do sexo feminino, sujeita o autor do crime a uma pena de 20 a 40 anos de reclusão.

Art. 121-A. Matar mulher por razões da condição do sexo feminino:
Pena – reclusão, de 20 (vinte) a 40 (quarenta) anos.    
§ 1º Considera-se que há razões da condição do sexo feminino quando o crime envolve:    
I – violência doméstica e familiar;    
II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher.    
§ 2º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime é praticado:    
I – durante a gestação, nos 3 (três) meses posteriores ao parto ou se a vítima é a mãe ou a responsável por criança, adolescente ou pessoa com deficiência de qualquer idade;    
II – contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental;    
III – na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima;    
IV – em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha);    
V – nas circunstâncias previstas nos incisos III, IV e VIII do § 2º do  art. 121 deste Código.      
Coautoria     
§ 3º Comunicam-se ao coautor ou partícipe as circunstâncias pessoais elementares do crime previstas no § 1º deste artigo.      (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)

Reflexos no Código Penal

Lesão corporal (art. 129, CP)

A pena para o crime de lesão corporal praticado contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou contra pessoa com quem o réu tenha convivido, passa a ser de reclusão de 2 a 5 anos. Antes do advento da lei, a pena para esse crime era de 3 meses a 3 anos.

Violência Doméstica 

 § 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

A lei também alterou a pena do parágrafo 13 do artigo 129 do Código Penal. Agora, se a lesão corporal é praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, a pena será igualmente de reclusão de 2 a 5 anos. Na redação antiga, a pena era de reclusão de 1 a 4 anos.

§ 13. Se a lesão é praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos

Crimes contra a honra (art. 138, 139 e 140, CP)

Os crimes contra a honra são injúria, difamação e calúnia. Tais delitos estão previstos nos artigos mencionados acima. Com o advento da lei, foi inserido o parágrafo terceiro no artigo 141 do Código Penal, para determinar que, caso tais crimes sejam praticados por razões da condição do sexo feminino, as penas serão aplicadas em dobro.

Art. 141, § 3º Se o crime é cometido contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, aplica-se a pena em dobro.

Ameaça (art. 147, CP)

O crime de ameaça, previsto no artigo 147 do Código Penal, também sofreu alterações em decorrência da nova lei, pois agora a pena será aplicada em dobro, caso a ameaça seja contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino.

Além disso, como todos sabem, o crime de ameaça sempre se processou mediante ação penal pública condicionada à representação. Ou seja, caso a representação não seja oferecida pela vítima em 6 meses, após o conhecimento da autoria, ocorrerá a extinção da punibilidade. Porém, com a alteração legislativa, o crime de ameaça praticado contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, será processado mediante ação penal pública incondicionada, independentemente de manifestação de vontade por parte da vítima.

Art. 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.

§ 1º Se o crime é cometido contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, aplica-se a pena em dobro.    

§ 2º Somente se procede mediante representação, exceto na hipótese prevista no § 1º deste artigo.   

Efeitos da condenação (art. 92, CP)

Passa a ser automática para o condenado, a perda do poder familiar e perda de cargo ou mandato eletivo ou proibição de futura nomeação em função pública.

Art. 92 – São também efeitos da condenação:       

I – a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo:        

a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;  

b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.        

II – a incapacidade para o exercício do poder familiar, da tutela ou da curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar, contra filho, filha ou outro descendente, tutelado ou curatelado, bem como nos crimes cometidos contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código;    

III – a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso.          

§ 1º Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença pelo juiz, mas independem de pedido expresso da acusação, observado o disposto no inciso III do § 2º deste artigo.     

§ 2º Ao condenado por crime praticado contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código serão:

I – aplicados os efeitos previstos nos incisos I e II do caput deste artigo;

II – vedadas a sua nomeação, designação ou diplomação em qualquer cargo, função pública ou mandato eletivo entre o trânsito em julgado da condenação até o efetivo cumprimento da pena;

III – automáticos os efeitos dos incisos I e II do caput e do inciso II do § 2º deste artigo.   

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.

§ 1º Se o crime é cometido contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, aplica-se a pena em dobro.    

§ 2º Somente se procede mediante representação, exceto na hipótese prevista no § 1º deste artigo.   

Reflexos nas legislações penais extravagantes

Lei n. 11.340/06 – Maria da Penha

A Lei Maria da Penha traz o crime de descumprimento de medida protetiva no artigo 24-A. Antes da lei, a pena para tal crime era 3 meses a 2 anos de detenção, porém agora o autor do crime se sujeita a uma pena de reclusão de 2 a 5 anos, além da multa.

Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: 

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Lei n. 8.072/90 – Crimes hediondos

O crime de feminicídio, anteriormente previsto como uma qualificadora do crime de homicídio, agora é elencado de maneira isolada e autônoma no art. 121-A. Com isso, a Lei dos Crimes Hediondos foi alterada, para que tal mudança seja refletida no texto da Lei n. 8.072/90.

Importante: o feminicídio já era considerado hediondo antes da entrada em vigor da nova lei, porém a Lei dos Crimes Hediondos foi alterada para reproduzir de maneira expressa a autonomia que o delito possui no Código Penal.

O reconhecimento do feminicídio como crime hediondo reflete a gravidade dessa violação dos direitos humanos. A alteração busca não apenas aumentar a pena, mas também dar maior visibilidade e gravidade a essa forma de violência de gênero.

Art. 1º São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, consumados ou

I-B – feminicídio (art. 121-A);      (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)

Decreto-Lei n. 3.688/41 – Contravenções Penais

No que se refere à contravenção penal de “vias de fato”, prevista no artigo 21 da lei, com a nova lei, caso seja praticada contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, a pena será aumentada do triplo.

Art. 21. Praticar vias de fato contra alguém:

Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de cem mil réis a um conto de réis, se o fato não constitui crime.

§ 2º Se a contravenção é praticada contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), aplica-se a pena em triplo.     (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)

Lei n. 7.210/84 – Execução Penal

Algumas alterações foram promovidas na Lei de Execução Penal, iremos analisá-las agora.

Inicialmente, caso um presidiário ou preso provisório por crime de violência doméstica ou familiar continue a ameaçar ou pratique novos atos de violência contra a vítima ou seus familiares durante o cumprimento da pena, ele será transferido para presídio distante do local de residência da vítima.

Art. 86, § 4º Será transferido para estabelecimento penal distante do local de residência da vítima, ainda que localizado em outra unidade federativa, inclusive da União, o condenado ou preso provisório que, tendo cometido crime de violência doméstica e familiar contra a mulher, ameace ou pratique violência contra a vítima ou seus familiares durante o cumprimento da pena.    

No que se refere à progressão de regime, o feminicida terá de cumprir 55% da pena para usufruir do benefício. Neste ponto, vale lembrar que antes da alteração, era necessário cumprir 50% da pena para a progressão.

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:   

VI-A – 55% (cinquenta e cinco por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de feminicídio, se for primário, vedado o livramento condicional;

Ao usufruir de qualquer benefício em que ocorra a sua saída do estabelecimento prisional, o condenado por crime contra a mulher deverá usar obrigatoriamente a tornozeleira eletrônica.

Art. 146-E. O condenado por crime contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), ao usufruir de qualquer benefício em que ocorra a sua saída de estabelecimento penal, será fiscalizado por meio de monitoração eletrônica.    

Além disso, a partir de agora o condenado por crime contra a mulher não poderá contar com visita íntima ou conjugal, circunstância que não existia antes da publicação da nova lei.

Conclusão: Um Avanço Necessário

A Lei n. 14.994/24 reflete um avanço significativo no combate à violência contra a mulher no Brasil, alinhando-se aos compromissos internacionais que o país assumiu em prol da proteção dos direitos humanos. Ao endurecer as penas e garantir a efetividade das medidas protetivas, a legislação busca não apenas punir, mas também prevenir novos atos de violência, criando um ambiente mais seguro para as mulheres.

Essas mudanças são essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, onde as mulheres possam viver sem medo de violência e discriminação. A sanção da Lei n. 14.994/24 representa, portanto, um passo decisivo em direção a um futuro mais seguro e respeitoso para todas as mulheres brasileiras.

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